Cultivar a amizade

Somos feitos uns para os outros, prova disso é o prazer, mais que o prazer, a doçura de uma companhia. Não falo de amor, embora a amizade tenha sempre um traço amoroso, amor é um sentimento mais tumultuado, nem sempre tranquilo. Amizade não, é mais calma, o amigo ou a amiga se retiram para que o outro fale, conte o que sente, reclame, esbraveje. O que damos na amizade não se importa muito com a reciprocidade, é paciente, confiante que um dia somos ombro, noutro somos o que encosta a cabeça. Amizade talvez só tenha uma exigência, o cultivo. Mesmo de longe, se não podemos estar perto, a saudade é uma forma de cultivo. Amigos brigam? Às vezes, mas a volta, que nunca demora muito, é uma pequena festa, pequena só por fora. Amizade, mais do que qualquer outro encontro humano, é capaz de ouvir a alma do outro, sem julgar, mesmo na discordância. Amizade é chuva fininha à noite e brisa suave à tarde. E nesses tempos de encontros (quase) impossíveis tomara que sejamos capazes de reinventar formas, mesmo que precárias, de encontro. Emails mais longos, já que nos falta a proximidade mais duradoura, corações que a distância saudosa nos convida a revelações que demorariam mais para vir à tona, reconciliações com os que não sabíamos quão preciosos eram. A mesma alma em dois corpos, alguém já disse isso. Não é assim mesmo?

Ricardo Fenati. “Amizade”. In: https://www.centroloyola.org.br/revista/outras-palavras/verso-e-reverso/2093-amizade

Meditação:

Estes tempos de distanciamento são uma ocasião favorável para refletirmos sobre nossas amizades. O que há de próprio nesta experiência tão humana? Que valor ela tem em nossa vida? Para nos ajudar a refletir sobre essas questões, o Passo a Pensar de hoje nos propõe o breve texto “Amizade”, do professor de filosofia Ricardo Fenati. Escutemos o que ele nos diz:

Segundo Ricardo Fenati, o prazer e a doçura de viver em companhia de outros apontam para um traço fundamental da nossa humanidade: ninguém é feito para si, mas para os outros. A construção paciente de relações de amizade é um modo bonito de realizar nossa sede relacional. Trago à memória os rostos de amigos e amigas. Como eles têm me ajudo em meu caminho de humanização?

O professor apresenta várias facetas de uma experiência de amizade: a alternância entre a escuta e a palavra, entre o sussurrar e o esbravejar, entre o consolar e o ser consolados, entre os desentendimentos e as reconciliações. Nesta dança de sentimentos e gestos, algo novo é plantado e cultivado em nós. Como tenho vivido essa alternância? Que novidades meus amigos e amigas têm plantado em mim?

O professor fala da importância de inventarmos novas formas de cultivo da amizade em tempos de distanciamento. Ele fala em escritos mais longos, mas também em revelações mais profundas e reconciliações desejáveis, que podem saciar nossa fome e sede de encontro. Como tenho cultivado minhas relações de amizade nestes tempos atípicos? Há algo a mudar, a melhorar?

Vamos chegando ao fim de mais um Passo a pensar. O que achei da reflexão proposta hoje? Gostaria de revisitar e aprofundar algum ponto que me pareceu esclarecedor?

A Faculdade Jesuíta deseja que você cultive belas amizades e se deixe cultivar por elas!

Locução: Lucimara Trevizan e Francys Silvestrini Adão SJ

Música: Kawil (gaivota, em língua mapuche). © 2016, Cristóbal Fones, SJ