Sem medo de sentir

Os sentimentos são paisagens áridas, imprecisas, tremeluzentes, desconfortáveis. Dito isto, poderia fechar a porta, correr as grades, trancar o cadeado, dar a loja por encerrada, sem previsões de reabertura. Fechados lá dentro, os sentimentos, bem, seria como se não existissem. Talvez morressem, se desidratassem, se pulverizassem, talvez deles restasse apenas uma mancha de gordura no chão. Em qualquer caso, emudeceriam. Ou não seriam escutados, o que vem a dar ao mesmo. Nunca contemplei esta hipótese por mais de cinco minutos – certamente, nem tanto. Não consigo. Não sei. Julgo que, no fundo, é o que menos quero. E que essa é a raiz da minha resistência. Crônica e aguda. Os sentimentos são onde sei viver, onde me sinto menos morto. Os sentimentos sou eu. Os melhores. Os piores. O beijo. A bala. (Ou vice-versa).

Miguel Martins. “Todos os nomes da intranquilidade”. Lérias. Lisboa: Averno, 2011. Disponível em: https://www.centroloyola.org.br/revista/bagagem/um-poema/963-todos-os-nomes-da-intranquilidade

Meditação:

Como compreendemos nossos próprios sentimentos? Como lidamos com eles? Para nos ajudar a refletir sobre essas questões, o Passo a Pensar de hoje nos propõe o texto “Todos os nomes da intranquilidade”, do poeta português Miguel Martins. Escutemos o que ele nos diz:

Miguel Martins fala-nos dos sentimentos, não a partir de conceitos, mas utilizando imagens e metáforas. Ele nos convida a nos determos neste árido e impreciso deserto interior, com sua capacidade de gerar iluminação, ainda que com uma luz trêmula, mas também desconforto. Essas imagens correspondem à sua experiência? Que outras metáforas você utilizaria para falar de seus sentimentos?

O poeta alerta para uma tendência perigosa: trancafiar os sentimentos, ignorá-los, não escutá-los. Seria uma desistência de contemplar, com atenção, esta rica e desafiante paisagem interior. Ninguém tem poder sobre o que sente, mas todos devem escolher dar ou não atenção ao que sentem. Você percebe em si e em torno de si esta tendência a emudecer o mundo interior? Qual tem sido sua escolha?

Miguel Martins partilha conosco sua opção: abraçar os sentimentos é uma oportunidade de descobrir-se vivo, ternamente tocado e duramente ferido pelo encontro com os outros. Todos os sentimentos – os melhores e os piores – revelam, assim, quem ele é. Como você tem aproveitado esta potente experiência de vida e de revelação?

Vamos chegando ao fim de mais um Passo a Pensar. Há algum ponto desta reflexão que você queira aprofundar e revisar?

A Faculdade Jesuíta deseja que sejamos homens e mulheres livres, sem medo de sentir!

Locução: Lucimara Trevizan e Francys Silvestrini Adão SJ

Música: As Rain In The Desert Brings Hope – D.T. Halpin, fsp/G.A. Richards, fsp © CD Sanctus – Paulinas.