A fé não explica o enigma da morte, mas busca e oferece um sentido. E que sentido poderia ter a morte?
Certa vez, um rabino voltava da sinagoga. Já em casa, sentiu falta do seu filho. Algumas vezes enquanto jantava perguntou à esposa onde estava o filho. Ela dava evasivas respostas. Mais tarde – quando ele já tinha jantado – ela disse-lhe: “Alguns tempos atrás veio um alguém aqui e me deu uma penhora para que eu a cuidasse. Era uma pérola preciosa e de grande beleza. Eu tinha posto minha alegria nesta pérola como se ele fosse minha. Hoje, enquanto estavas na sinagoga, este alguém chegou e pediu sua pérola de volta. Devo devolvê-la?” De modo sério o rabino a repreendeu: “Mas que pergunta? Como podes hesitar em devolver um bem alheio a nós confiado?” Então a esposa o tomou pela mão e o conduziu até o quarto. Levantou o lençol e mostrou-lhe o filho morto. O rabino agarrou o filho gritando em desespero. A esposa disse-lhe: “Você não disse que a penhora alheia devia ser devolvida? ‘O Senhor deu, o Senhor tirou. Seja louvado o nome do Senhor!’”. Eis um sentido: devolver o bem alheio, aquilo que de fato não nos pertence. (…) Eu quero viver, pois este é o desejo de toda criatura. A vida é bela. Tenho sonhos e planos. Gostaria de viver neste mundo mais uns anos. Vou lutar para viver enquanto me restarem forças. Mas quando minha hora realmente chegar, pedirei a Deus tempo para dizer três palavrinhas. Caso eu não tenha este tempo, já as antecipo aqui. Às pessoas que causei algum dano, que desiludi ou frustrei: “de coração sincero me perdoem!”; às pessoas que enobrecem a vida humana, que realizam o sentido simbolizado na cruz doando-se como têm feito os agentes de saúde e prestadores de serviços essenciais: “O Senhor vos abençoe e vos guarde!” (Nm 6,24) e; a Deus: “Muito obrigado!”
Meditação:
Este tempo de pandemia coloca-nos diante da dura e inelutável realidade da morte. Que palavras brotam em nós ao encararmos, com coragem, esta realidade? O Passo a pensar de hoje nos propõe refletir sobre isso, a partir de um trecho do texto “É preciosa aos olhos do Senhor a morte de seus fiéis”, do biblista e professor Rivaldave Paz Torquato. Escutemos o que ele tem a nos dizer:
Frei Rivaldave Paz Torquato, utilizando um recurso sapiencial do mundo bíblico, conta-nos uma parábola. Nela, o sentido da morte só pode ser compreendido a partir do reconhecimento de que nossa existência e a existência das pessoas que amamos é uma dádiva, um dom gratuito. Como escuto esta parábola? Como tenho lidado com as “pérolas” que me foram confiadas?
O biblista não sugere uma atitude conformista diante da certeza da morte. Ao contrário, ao olhar de frente para nossa finitude, podemos aprofundar nosso gosto e nossa luta pela vida, nossa apreciação da beleza, nossa capacidade de sonhar mais alto. Tenho aproveitado este tempo para reafirmar meu compromisso com a vida: a minha e a dos outros?
Escutemos, uma vez mais, a reflexão de Rivaldave Paz Torquato.
Frei Rivaldave compartilha conosco as três palavras que ele gostaria de dizer, quando chegar a hora de sua morte. Mas ele já as pronuncia agora! De fato, olhar para a morte deveria nos ajudar a redefinir, hoje, nossas palavras e ações: sim, podemos reconhecer nossos erros, bendizer os outros, agradecer a Deus pelos dons recebidos. Quais palavras de vida brotam em mim nestes tempos de pandemia?
O Passo a pensar de hoje vai chegando ao fim. Quais pontos desta reflexão eu gostaria de aprofundar?
A Faculdade Jesuíta deseja que você, sem temer a morte, encontre palavras e gestos que conduzem à vida!
Texto: Frei Rivaldave Paz Torquato O. Carm. “É preciosa aos olhos do Senhor a morte de seus fiéis” (Sl 116,15). Disponível em: https://www.faculdadejesuita.edu.br/artigo/-e-preciosa-aos-olhos-do-senhor-a-morte-de-seus-fieis-sl-116-15–22062020-183205
Música: As I Kneel Before You – Maria Parkinson Higgins © CD Sanctus – Paulinas.
Locução: Lucimara Trevizan e Francys Silvestrini Adão sj