Nenhum de nós escolheu passar por este tempo de provação e de privação. Mas como esta dor pode nos ser útil? O Passo a Pensar de hoje quer nos ajudar a refletir sobre isso, a partir do texto “Um dia esta dor vai nos ser útil”, do biblista, poeta e cardeal José Tolentino Mendonça. Escutemos o que ele nos diz:
Não saímos ainda da pandemia, a verdade é essa. E como não a podemos remover da história concreta deste nosso presente com a facilidade que desejaríamos, a tentação atual é a de a removermos dentro de nós, ensaiando uma espécie de negação. A realidade é o que é, sabemo-lo bem, mas passamos a interpretá-la de uma forma mais aceitável para nós. (…) Não queremos ouvir falar do problema ou tentamos reorientar a ameaça que ele representa, convencendo-nos que os grupos de risco são sempre os outros. (…) [Porém] As experiências dolorosas podem tornar-se oportunidades para redescobrir que a vulnerabilidade também nos ensina coisas de que precisamos. Mas é necessário que não enxotemos depressa demais essas experiências para debaixo do tapete. Mais do que fugas precisamos de resiliência, conscientes da gravidade desta hora. Mais do que nos precipitarmos numa mudança de assunto (…), seria importante elaborá-lo em profundidade, e isso só acontece se tivermos a coragem de o fazer emergir. Mais do que nos escondermos uns dos outros, apostados numa gestão individualista da questão, torna-se indispensável que nos encontremos num discurso de comunidade. (…) Por isso, a pergunta mais urgente não é quanto tempo precisamos (…) para voltar à situação em que estávamos. A pergunta mais premente é: como é que esta dor nos pode ser útil? E a resposta é inequívoca: se redescobrirmos o sentido do próximo. Se este aluvião nos ensinar a nadar no campo da atenção solidária à vida frágil, tal como se declina em nós e nos outros.
Meditação:
José Tolentino Mendonça fala de um fenômeno perceptível entre nós, uma espécie de tentação: muitos de nós começaram a negar a realidade da pandemia ou pensam que o risco é para os outros, e não para si. Após estes meses, percebo em mim esta reação? Como se comportam as pessoas à minha volta?
O poeta nos convida a sermos aprendizes de nossa vulnerabilidade, revelada por este tempo. Para isso, é necessário decidir não fugir: precisamos de consciência, resiliência e profundidade. O que tenho aprendido com este tempo? Tenho superado minha surdez e escutado o que dizem nossas “entranhas” pessoais e coletivas?
Para Tolentino, este tempo de dor pode nos ajudar a redescobrir o sentido do próximo, a lembrar que ninguém está sozinho neste mundo, a dar atenção à fragilidade em nós e nos outros. Se chegarmos a isso, tanta dor não terá sido em vão. Como tenho feito este caminho interior e ajudado outras pessoas a encontrá-lo também?
Vamos chegando ao fim de mais um Passo a pensar. Em que pontos a reflexão de hoje mais lhe inspirou e provocou?
A Faculdade Jesuíta deseja que sejamos aprendizes, para que a dor deste tempo não seja em vão!
Texto: José Tolentino Mendonça. “Um dia esta dor vai nos ser útil”. In: https://expresso.pt/opiniao/2020-07-11-Um-dia-esta-dor-vai-nos-ser-util.
Locução: Lucimara Trevizan e Francys Silvestrini Adão sj
Música: Morning Has Broken – Tradicional Gaelic Melody © CD Sanctus – Paulinas.