A ilusão da perfeição

Virtudes (…) são traços humanos e nossa humanidade a tudo marca, em tudo está presente. E onde estamos está nossa ambivalência, nossa incompletude, nossa escuta interminável de nós mesmos e, tantas vezes, nosso desejo de uma identidade mais plena, que nos livre dessa abertura que nos constitui e com a qual temos que nos haver. Ora, nosso esforço em direção a uma virtude – seja a bondade, a generosidade, a humildade ou outras ainda – pode despertar o sempre possível orgulho em nós e nos levar a uma traiçoeira convivência com nossas virtudes. Imaginando-nos na posse absoluta de um bem – por exemplo, sempre generosos – acabaremos derrubados mesmo aí onde nos sentíamos completamente em casa. Não é dada à condição humana nenhuma espécie de perfeição, somos sempre alguma mistura em andamento, a propósito da qual cabe esperar que o melhor prevaleça, ainda que não sempre. A pretensão de rejeitar inteiramente o mal, desconhecendo quem somos, desencadeará, como a história de todos nós e mesmo a história geral registram, um mal ainda maior. Como sempre, a vigília paciente, silenciosa e acolhedora é mais própria do humano do que a ilusão da perfeição.

Ricardo Fenati. “Virtudes e limites”. In: https://www.centroloyola.org.br/revista/outras-palavras/verso-e-reverso/2433-virtudes-e-limites

Meditação:

Nem sempre sabemos conjugar a busca de uma vida virtuosa e a aceitação da imperfeição de nossa condição humana. Como lidar com esta ambivalência? O Passo a Pensar de hoje quer nos ajudar a refletir sobre isso, a partir de um trecho do texto “Virtudes e limites”, do professor de filosofia Ricardo Fenati. Escutemos o que ele nos diz:

Ricardo Fenati apresenta a condição humana como ambivalente, incompleta, aberta às mudanças. Por isso, mesmo o louvável esforço por desenvolver virtudes pode nos colocar numa situação ambígua, ocultando orgulhos ou vaidades. Você nota esta ambiguidade em você e em suas relações? Como você lida com esta verdade desconfortável?

O professor de filosofia é categórico: a perfeição não é um atributo dos seres humanos. Como nenhum bem nos pertence de modo absoluto, cabe a nós aprender a conviver com as misturas e as transformações, esforçando-nos e esperando que, em nossos combates interiores, vença o que há de melhor em nós. Você acolhe suas imperfeições e os limites dos outros? Como vive seus combates?

Ricardo Fenati faz um alerta: a rejeição em considerar a parcela do mal que existe em nós acaba por nos cegar. Deixamos de conhecer a complexidade de quem nós somos e projetamos toda a negatividade no outro, gerando violências e exclusões. Ao contrário de uma complacência, o filósofo nos convida à vigilância e ao trabalho paciente sobre nós mesmos. Você tem lucidez sobre seus pontos fortes e fracos? É vigilante para não projetar o mal somente nos outros?

O Passo a Pensar de hoje vai chegando ao fim. O que mais lhe chamou a atenção na reflexão de hoje?

A Faculdade Jesuíta deseja que tenhamos lucidez e paciência em nosso exigente processo de humanização!

Produção e apresentação: Lucimara Trevizan e Francys Silvestrini Adão SJ

Música: As Rain In The Desert Brings Hope – D.T. Halpin, fsp/G.A. Richards, fsp © CD Sanctus – Paulinas.