Com razão, o salmo bíblico (…) previne que “a existência humana é semelhante à erva; floresce como a flor do campo, que se esboroa quando o vento sopra”. Mas nada a esfarela, a reduz, a desfaz, a pulveriza como a guerra. Porque, entre as vítimas a chorar, não estão só o presente ou o passado, mas também a ideia de um futuro possível, de um futuro melhor. A totalitária insensibilidade pelo destino real dos seres humanos, a indiferença pela singularidade que jamais deveria ser sacrificável, a substituição dos nomes próprios pela árida retórica da dominação faz desaparecer do horizonte a história. A história continuará, sim, mas não será mais a mesma. É isso que os milhões de sacrificados nos gritam. Esse lancinante cortejo de espoliados em busca de salvaguarda, esbracejando pela sobrevivência, desejando que em qualquer parte ainda se pronuncie para eles a palavra vida. Mesmo calados, é isso que nos gritam. (…) As guerras deviam ser sempre contadas do ponto de vista deles. (…) Não se pode mascarar a irrupção trágica da guerra como se fosse apenas uma operação política que, a um dado momento, e por um qualquer cálculo, é considerada necessária.
José Tolentino Mendonça. “O herbário da infelicidade”. In: https://www.imissio.net/artigos/53/4607/o-herbario-da-infelicidade-por-tolentino-mendonca/
Meditação:
Qual é a lógica da guerra? Como podemos compreendê-la em todo o seu drama e tragédia? Para nos ajudar a refletir sobre isso, o Passo a Pensar de hoje propõe um trecho do texto “O herbário da infelicidade”, do poeta e cardeal português José Tolentino Mendonça. Escutemos o que ele nos diz:
José Tolentino começa sua reflexão, partindo do texto bíblico. A fragilidade e a vulnerabilidade fazem parte de nossa condição humana. As guerras, não. Mas elas destroem a existência e as esperanças de um futuro mais bonito. Qual é a diferença entre uma fragilidade natural e uma instabilidade provocada?
O poeta deixa claro que há dois campos de valores. De um lado, há a vida real das pessoas, a singularidade de cada um, os nomes próprios. Em resumo, gente concreta. Do outro lado, há uma insensibilidade totalitária, a indiferença e o sacrifício alheio, um discurso de dominação. Em resumo, ideologias. Você percebe esta troca da realidade pelas ideias na lógica da guerra?
Tolentino interpela seu leitor. A única perspectiva legítima para se compreender a loucura da guerra é a dos espoliados, sofredores, sacrificados. Nenhuma razão política, nenhum cálculo, nenhum discurso devem tentar justificar este horror como necessário, diante daqueles que gritam e buscam sobreviver. Como esta interpelação reverbera em mim?
Vamos chegando ao fim de mais um Passo a Pensar. Há algum ponto desta reflexão que você queira aprofundar e revisar?
A Faculdade Jesuíta deseja que nós arranquemos as máscaras ideológicas das guerras e sejamos artífices da paz!
Música: It Is Well With My Soul – Horatio G. Spafford/Philip P. Blis © CD Sanctus – Paulinas.
Locução: Lucimara Trevizan e Francys Silvestrini Adão SJ