A solidão da culpa

Por que me culpo quando me agridem? Digo, por exemplo: “que mal fiz eu para que ‘X’ me tratasse assim?”. E essa frase oculta outra: “se estou sofrendo, devo ter feito algo de errado”. (…) E essa forma de pensar e de sentir não está somente em mim. Em toda parte, em todas as culturas, nas comunidades que conheço, entre amigos ou autoridades, busca-se o culpado pelo sofrimento. E com escandalosa frequência, cada um de nós experimenta-se culpado pelo mal que a violência do mundo lhe impõe. (…) Tal atitude conduz à paralisia. Quem se culpa não age. Condena-se, aprisiona-se e “desculpa-se” assim por existir. (…) E há os que expressam a culpabilidade como julgamento. Deslocam a condenação para fora, para os outros. Ocultam-se na crítica que destrói. (…) Nos dois casos, a culpabilidade doentia enjaula em solidão a pessoa ferida. (…) E, no entanto, qual mistério que desafia a lógica, um dia se reacende o desejo de “ir além”. (…) Mas como retomar a convivência humana e romper os grilhões invisíveis que nos freiam? Algo consistente deve chocar-se contra a casca imaginária e quebrá-la. O olhar que não condena cruza o meu olhar, seguido da palavra gratuita e do gesto generoso. Alguém me desconcerta e eu não sei o que dizer. Parecia estar isolado de tudo e, de repente, ouço vozes e percebo um sorriso amigo ao meu lado. O tempo da prisão desembocou na oportunidade do encontro. (…) O horizonte se reabriu.

Álvaro Mendonça Pimentel. “Não te culpes se te agridem”. Disponível em: https://faculdadejesuita.edu.br/fajeonline/palavra-presenca/nao-te-culpes-se-te-agridem/

Meditação:

Por que sentimos culpa? O que isso provoca em nós? Como sair desta espiral paralisante? Para nos ajudar a refletir sobre este tema, o Passo a Pensar de hoje traz um trecho do texto “Não te culpes se te agridem”, do jesuíta e professor de filosofia Álvaro Mendonça Pimentel. Escutemos o que ele nos diz:

Álvaro Pimentel fala da culpa como um fenômeno universal, experimentado por todas as culturas, classes sociais, gerações… Ela estaria relacionada à tentativa de encontrar uma causa para nosso sofrimento. Você consegue perceber esta mesma reação diante de sua dor? Observa isso nas pessoas à sua volta?

O professor apresenta as duas respostas mais frequentes diante da busca de culpados: ou o peso recai sobre nós mesmos – e nos aprisionamos neste sentimento – ou colocamos este peso nas costas dos outros – e entramos numa dinâmica de críticas e condenações destruidoras. Em ambos os casos, o efeito é a solidão, o isolamento. Identifico esse mecanismo e estes efeitos em mim? Tendo mais à autocondenação ou à culpabilização dos outros?

Álvaro Pimentel narra, de modo emocionante, o que torna possível a saída desta prisão: o desejo de ir além e o encontro com a generosidade gratuita de outra pessoa. Isto é da ordem da surpresa que desconcerta, do imprevisto que não pode ser calculado, da abundância da graça. Você já experimentou isso em sua vida? Já se sentiu salvo/a pelo olhar desarmado de um/a amigo/a?

Vamos chegando ao fim de mais um Passo a Pensar. Você concorda com a reflexão proposta? Deseja retomar e aprofundar algum ponto específico?

A Faculdade Jesuíta deseja que sejamos uns para os outros este olhar generoso que nos salva da culpa e nos arranca das garras da solidão!

Locução: Lucimara Trevizan e Francys Silvestrini Adão SJ

Música: Wayra © 2016, Cristóbal Fones SJ