Alguns pensadores contrapõem o “mundo segundo o olhar” ao “mundo segundo o escutar”. Segundo eles, a visão, que está na origem da filosofia grega e perpassa toda a racionalidade científica do mundo ocidental, é determinada pelo cosmos e tende a “objetivar” e manipular tudo o que é passível de apreensão do olhar. Essa racionalidade está na origem da dominação do mundo pela técnica, que levanta tantas questões nas últimas décadas, sobretudo por causa das ameaças que a objetivação e a exploração representam para o futuro da vida no planeta. Por sua vez, a escuta, que é central no mundo bíblico, mais que pelo cosmos, está fundada nas relações, que estão na origem da ética e da fé. (…) A contraposição entre o mundo como cosmos e o mundo como relação é interessante, embora deva ser matizada, uma vez que todos os sentidos participam da apreensão do real. As diferenças podem, contudo, ajudar a perceber o que mais conta no acesso de cada pessoa ao mundo e que define sua percepção da própria experiência religiosa e espiritual. De fato, muitos fiéis buscam na religião o maravilhoso, o milagroso, que provoca “temor e tremor”. (…) Diferente é a experiência de relação com Deus segundo a revelação bíblica, para a qual, mais que sagrado, Deus é santo e chama à santidade. Esta, diferente da sacralidade, supõe relação, que por sua vez, demanda a escuta, a capacidade de deixar-se afetar pela alteridade, seja a do ser humano, qualquer que seja a sua condição, seja a de Deus, que ama e convida a amá-lo. Essa dupla dinâmica deve “mover as entranhas”, levando à compaixão, ao cuidado e à defesa do outro em situação de vulnerabilidade, ou ao agradecimento e ao louvor, entendendo-se fruto de um dom gratuito e imerecido.
Geraldo Luiz De Mori. “A escuta como origem da beleza, da bondade e da verdade do mundo”. In: https://faculdadejesuita.edu.br/fajeonline/palavra-presenca/a-escuta-como-origem-da-beleza-da-bondade-e-da-verdade-do-mundo/
Meditação:
De que maneira nossa compreensão do mundo influencia nossa relação com os outros e com Deus? O Passo a Pensar de hoje quer nos ajudar a refletir sobre isso, a partir do texto “A escuta como origem da beleza, da bondade e da verdade do mundo”, do teólogo jesuíta Geraldo Luiz De Mori. Escutemos o que ele nos diz:
Geraldo De Mori apresenta duas maneiras complementares de se relacionar com o mundo, fundadas em sentidos corporais diferentes: a visão e a audição. A visão seria a matriz do conhecimento técnico, enquanto a escuta conduziria à ética e à fé. Você já tinha refletido sobre isso? Qual desses sentidos é mais central em sua relação com o mundo?
Segundo o teólogo, os dois sentidos corporais fundam modos distintos de compreender a realidade: o mundo pode ser concebido como um cosmos, um todo ordenado que deve ser conhecido e explorado, ou o mundo pode ser recebido como relação, como algo em construção a partir do dom e de uma aliança livre. Qual dessas duas concepções se aproxima mais de sua própria experiência?
O jesuíta aponta uma diferença espiritual à base destas duas visões de mundo: nós podemos conceber Deus como uma realidade sagrada – que gera admiração, mas também medo e desejo de distância – ou como o Santo que santifica, o que deve conduzir a um modo de relação compassivo com os outros. Qual dessas atitudes corresponde à sua relação com Deus?
Vamos chegando ao fim de mais um Passo a Pensar. Em que pontos a reflexão de hoje mais lhe inspirou e provocou?
A Faculdade Jesuíta deseja que todos nossos sentidos nos abram à relação e à liberdade do amor!
Produção e apresentação: Lucimara Trevizan e Francys Silvestrini Adão SJ
Música: Be Thou My Vision – J.H. Desrocquettes/Ancient Gaelic © CD Sanctus – Paulinas.